domingo, 9 de novembro de 2008

Ela dizia que parecia uma despedida

Parei de pintar de neon a sua existência. Você agora é uma pessoa normal e não mais o roqueiro que eu achava o máximo. Você também tem uma família e por mais que ao longo dos anos eu tenha desacreditado que você tem um coração dentro do peito, a biologia me diz que tem sim! Você ainda é um homem e corinthiano. Tem a letra feia, usa gírias antigas, vai na apresentação de fim de ano da sobrinha. Você ainda odeia fofoca e ainda se acha feio. Não é apenas porque seu coração não dispara quando me vê que você parou de sentir. Um dia eu vou acordar e não mais amar seus passos largos e vou parar de achar linda a sua unha mal cortada. Porque minha descoberta é que você também corta a unha, tira cutícula! Você não é pintado de ouro, você respira o mesmo ar que eu e olha, você tem uma mãe! E olha, não foi uma criatura maravilhosa e fantástica que te colocou no mundo. Foi uma mulher meio parecida com a minha mãe que sai todos os dias para trabalhar e volta mega cansada e ainda tem que preparar a janta pois se separou do seu pai quando você ainda não tinha nem três anos. Sua casa de número 32 é um sobradinho cheio de tijolinhos com uma cerquinha branca. Mas principalmente foi aquela cerquinha que você empurrou chorando porque depois de três anos eu empurrei a cerquinha pra não entrar mais. Chorou porque idolatrar suas gírias, manias, já não bastava mais... Depois de três anos, você caiu na normalidade. Foi quando então o que eu temia aconteceu: a paixão, o fogo que você acendia em mim, virou uma coisa cem vezes mais abstrata, mais maravilhosa e maior. Virou amor. Porque ainda que sua letra seja feia, eu quero que você escreva em um pedaço de guardanapo que me ama e ainda que sua mãe seja só mais uma como tantas no mundo, é com ela que eu quero conversar sobre vasinhos de porcelana. E ainda que seus pés sejam ásperos, eu quero que eles cisquem em mim no meio da noite pra que só assim alguém tire os meus do chão e enfim me faça sonhar.

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